«Quem diz que escreve para si próprio [...] é assustadoramente ateu.»
― Umberto Eco
É usual ficar enredado a construir um pensamento, um aforismo, uma boa meia hora. O trabalho fica completo quando já nenhuma alteração é possível, seja porque a ideia ficou aceitavelmente expressa, seja porque qualquer mexida irá desconjuntar o texto, ou simplesmente porque o cansaço e o aborrecimento não permitem mais. Mas nem sempre resulta assim; também sucede uma péssima execução destruir uma boa ideia, uma frase de efeito provir de pensamento medíocre, ou a imagem e a escrita batalharem de tal forma entre si que o resultado é uma assegurada destruição mútua(MAD).
Não incorro na desmesura de Flaubert que buscava sem descanso, durante semanas a fio, a palavra exacta (le mot juste), para uma qualquer oração do seu Madame Bovary. Eis que a obra-prima tem hoje mais de quinhentas traduções (merdosas) em todo o mundo e o
trabalho excruciante de Flaubert não faz diferença alguma para o
não leitor da língua francesa.
Vem tudo isto a propósito do trabalho de edição ou revisão de texto que António Lobo Antunes menciona na sua entrevista ao jornal Público, suplemento Ípsilon.*
Quando ALA revela que Steiner perdoa a Nabokov os seus pecados, pois sem ele não teríamos Lolitas, a Flaubert devemos agradecer a minúcia, foi ele o autor da verdadeira balzaquina (a MILF actual) - aos trinta é cedo.**
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*Algures em Novembro de 2014.
**A parte restante perdeu-se e ainda bem. Acho.
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