quinta-feira, 17 de fevereiro de 2011

Augusto Gil (1873-1929)

BALADA DA NEVE

Batem leve, levemente,
como quem chama por mim.
Será chuva? Será gente?
Gente não é, certamente
e a chuva não bate assim.

É talvez a ventania:
mas há pouco, há poucochinho,
nem uma agulha bulia
na quieta melancolia
dos pinheiros do caminho...

Quem bate, assim, levemente,
com tão estranha leveza,
que mal se ouve, mal se sente?
Não é chuva, nem é gente,
nem é vento com certeza.

Fui ver. A neve caía
do azul cinzento do céu,
branca e leve, branca e fria...
– Há quanto tempo a não via!
E que saudades, Deus meu!

Olho-a através da vidraça.
Pôs tudo da cor do linho.
Passa gente e, quando passa,
os passos imprime e traça
na brancura do caminho...

Fico olhando esses sinais
da pobre gente que avança,
e noto, por entre os mais,
os traços miniaturais
duns pezitos de criança...

E descalcinhos, doridos...
a neve deixa inda vê-los,
primeiro, bem definidos,
depois, em sulcos compridos,
porque não podia erguê-los!...

Que quem já é pecador
sofra tormentos, enfim!
Mas as crianças, Senhor,
porque lhes dais tanta dor?!...
Porque padecem assim?!...

E uma infinita tristeza,
uma funda turbação
entra em mim, fica em mim presa.
Cai neve na Natureza
– e cai no meu coração.

3 comentários:

  1. Um dos poemas preferidos de muitas gente. :) embora alguns terminem com: fui ver, porra, eram testemunhas de geová...(não és pois não?)


    Bem, em todo o caso dei com isto e achei q podias achar alguma piada: http://www.superinteressante.pt/index.php?option=com_content&view=article&id=432:mutacao-associada-ao-nanismo-previne-cancro-e-diabetes-&catid=2:noticias&Itemid=76

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  2. declamei essa cena em grupo ai ha cerca de um mes, depois de um belo jantar regado a tintol no meio de um cenario de neve dantesco...

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  3. Maria Flausina16:06

    Aposto que milhares de pessoas, assim como eu, só conheciam os 4 primeiros versos deste poema, seguidos das mais variadas derivações cómico-aparvatadas...
    Afinal não é assim tão cómico, mas gostei imenso.
    Obrigada Gigante!

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