domingo, 16 de outubro de 2011

Mano a mano

«Deixem as mulheres bonitas para os homens sem imaginação.»
- Marcel Proust

«A tua beleza está perto, apenas à distância de um interruptor.»
- Hugo V.

4 comentários:

  1. O Hugo vai longe, vai.

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  2. A moça mostrava a coxa

    A moça mostrava a coxa,
    a moça mostrava a nádega,
    só não mostrava aquilo
    - concha, berilo, esmeralda -
    que se entreabre, quatrifólio,
    e encerrra o gozo mais lauto,
    aquela zona hiperbórea,
    misto de mel e de asfalto,
    porta hermética nos gonzos
    de zonzos sentidos presos,
    ara sem sangue de ofícios,
    a moça não me mostrava.
    E torturando-me, e virgem
    no desvairado recato
    que sucedia de chofre
    á visão dos seios claros,
    qua pulcra rosa preta
    como que se enovelava,
    crespa, intata, inacessível,
    abre-que-fecha-que-foge,
    e a fêmea, rindo, negava
    o que eu tanto lhe pedia,
    o que devia ser dado
    e mais que dado, comido.
    Ai, que a moça me matava
    tornando-me assim a vida
    esperança consumida
    no que, sombrio, faiscava.
    Roçava-lhe a perna. Os dedos
    descobriam-lhe segredos
    lentos, curvos, animais,
    porém o maximo arcano,
    o todo esquivo, noturno,
    a tríplice chave de urna,
    essa a louca sonegava,
    não me daria nem nada.
    Antes nunca me acenasse.
    Viver não tinha propósito,
    andar perdera o sentido,
    o tempo não desatava
    nem vinha a morte render-me
    ao luzir da estrela-dalva,
    que nessa hora já primeira,
    violento, subia o enjoo
    de fera presa no Zôo.
    Como lhe sabia a pele,
    em seu côncavo e convexo,
    em seu poro, em seu dourado
    pêlo de ventre! mas sexo
    era segredo de Estado.
    Como a carne lhe sabia
    a campo frio, orvalhado,
    onde uma cobra desperta
    vai traçando seu desenho
    num frêmito, lado a lado!
    Mas que perfume teria
    a gruta invisa? que visgo,
    que estreitura, que doçume,
    que linha prístina, pura,
    me chamava, me fugia?
    Tudo a bela me ofertava,
    e que eu beijasse ou mordesse,
    fizesse sangue: fazia.
    Mas seu púbis recusava.
    Na noite acesa, no dia,
    sua coxa se cerrava.
    Na praia, na ventania,
    quando mais eu insistia,
    sua coxa se apertava.
    Na mais erma hospedaria
    fechada por dentro a aldrava,
    sua coxa se selava,
    se encerrava, se salvava,
    e quem disse que eu podia
    fazer dela minha escrava?
    De tanto esperar, porfia
    sem vislumbre de vitória,
    já seu corpo se delia,
    já se empana sua glória,
    já sou diverso daquele
    que por dentro se rasgava,
    e não sei agora ao certo
    se minha sede mais brava
    era nela que pousava.
    Outras fontes, outras fomes,
    outros flancos: vasto mundo,
    e o esquecimento no fundo.
    Talvez que a moça hoje em dia...
    Talvez. O certo é que nunca.
    E se tanto se furtara
    com tais fugas e arabescos
    e tão surda teimosia,
    por que hoje se abriria?
    Por que viria ofertar-me
    quando a noite já vai fria,
    sua nívea rosa preta
    nunca por mim visitada,
    inacessível naveta?
    Ou nem teria naveta...

    Carlos Drummond de Andrade

    (eu sei q já percebeste q gosto da poesia dele :p)

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  3. Mas tb gosto do Vão Gogo:

    Poesia Matemática
    “Às folhas tantas
    do livro matemático
    um Quociente apaixonou-se
    um dia
    doidamente
    por uma Incógnita.
    Olhou-a com seu olhar inumerável
    e viu-a do ápice à base
    uma figura ímpar;
    olhos rombóides, boca trapezóide,
    corpo retangular, seios esferóides.
    Fez de sua uma vida
    paralela à dela
    até que se encontraram
    no infinito.
    “Quem és tu?”, indagou ele
    em ânsia radical.
    “Sou a soma do quadrado dos catetos.
    Mas pode me chamar de Hipotenusa.”
    E de falarem descobriram que eram
    (o que em aritmética corresponde
    a almas irmãs)
    primos entre si.
    E assim se amaram
    ao quadrado da velocidade da luz
    numa sexta potenciação
    traçando
    ao sabor do momento
    e da paixão
    retas, curvas, círculos e linhas sinoidais
    nos jardins da quarta dimensão.
    Escandalizaram os ortodoxos das fórmulas euclidiana
    e os exegetas do Universo Finito.
    Romperam convenções newtonianas e pitagóricas.
    E enfim resolveram se casar
    constituir um lar,
    mais que um lar,
    um perpendicular.
    Convidaram para padrinhos
    o Poliedro e a Bissetriz.
    E fizeram planos, equações e diagramas para o futuro
    sonhando com uma felicidade
    integral e diferencial.
    E se casaram e tiveram uma secante e três cones
    muito engraçadinhos.
    E foram felizes
    até aquele dia
    em que tudo vira afinal
    monotonia.
    Foi então que surgiu
    O Máximo Divisor Comum
    freqüentador de círculos concêntricos,
    viciosos.
    Ofereceu-lhe, a ela,
    uma grandeza absoluta
    e reduziu-a a um denominador comum.
    Ele, Quociente, percebeu
    que com ela não formava mais um todo,
    uma unidade.
    Era o triângulo,
    tanto chamado amoroso.
    Desse problema ela era uma fração,
    a mais ordinária.
    Mas foi então que Einstein descobriu a Relatividade
    e tudo que era espúrio passou a ser
    moralidade
    como aliás em qualquer
    sociedade.”


    Já do Hugo...

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