quinta-feira, 3 de fevereiro de 2011

Jorge Luis Borges e a "Nova Gente"



Não consigo entender uma sociedade que começou a jogar xadrez e degenerou-se ao ponto de acabar a jogar futebol. 
- Jorge Luis Borges*
Por comentários deste calibre raramente compro biografias e evito, sempre que posso, ou o aborrecimento ou a curiosidade não contrariam, ler entrevistas de escritores.   

Não é fácil, posteriormente, descolar o autor dos sound bytes promocionais (não é o caso), da sua vida doméstica (também não), ou das suas opiniões sobre o mundo e a vida.

Sorte a de já possuir opinião sobre Borges, quando soube que recebeu Augusto Pinochet na sua casa da Suíça. Isto num tempo em que já se sabia ao que ele tinha ido. Comentou mais tarde o cego, que ao ver o general, percebeu o quanto este era importante para o Chile, «mantinha a disciplina na nação». Por motivos semelhantes Heidegger desgostou-me profundamente. Um filósofo que, na adolescência, me concedeu a ilusão de entender o Dasein

É lógico, elementar e evidente, que devemos separar o homem da sua obra - “Ninguém é um herói para o seu criado de quarto.” -, por isso mesmo fico-me pela obra e quanto pretendo saber "como vai a vida" de homens e mulheres leio a Nova Gente, no dentista.

Não sou criatura de muitos preconceitos, mas, os que fazem pactos com Belzebu, cheiram sempre a enxofre.

* Citado por Luís Freitas Lobo, in Ler, p. 40, Junho de 2010.

11 comentários:

  1. Tenho dificuldade em separar o homem da obra, confesso, mas apenas em casos que me afectam enquanto ser humana.
    Quanto a ler noticias sobre o que escritores, cantores, actores.... fazem fora de cena, não me interessa minimamente.

    ResponderEliminar
  2. Mas queria dizer, se alguém souber que o Mia Couto está novamente solteiro, avisem-me.
    Obrigada.

    ResponderEliminar
  3. Não sei o que é melhor, se um erudito boçal ou um boçal erudito.

    ResponderEliminar
  4. eu não me importo de ler o que dizem os autores mas ignoro aquilo de que não gosto ou relativizo bastante, incluindo pactos com Belzebu. As próprias obras podem ser moralmente condenáveis mas se forem boas, não me importo (não deixa de ser um filho da puta como pessoa). As próprias obras ou criações até podem ser moralmente condenáveis e mesmo assim bem feitas. Por exemplo, acho a iconografia nazi fascinante, a suástica, as caveiras das SS etc. mas tendo a relativizar para uma coisa quase "pop", no sentido estético, diz que os próprios uniformes foram desenhados pelo Hugo Boss. Um cogumelo nuclear é algo de belo e fascinante também, uma mistura de ciência e morte levada ao extremo. E os aviões de combate, a tecnologia da morte, é algo de fascinante. Mas evidentemente que odeio os nazis e sou contra as armas nucleares e gostaria que não existissem e por mim viveríamos em paz no mundo, sem guerras e aviões e armas. Não te sei explicar bem. O Borges até podia ter morto e torturado comunistas com as próprias mãos, era-me indiferente. Mesmo coisas que foram feitas num contexto de propaganda, como os filmes da Leni Riefenstall (bad spelling provavelmente), quando vistas 60-70 anos depois, podem ser apreciadas apenas como coisas estéticas desprovidas de efeito.

    ResponderEliminar
  5. Tolan, concordo contigo, em parte.
    O que me assusta mais é o facto de serem pessoas que têm projecção mediática e que são aduladas.

    ResponderEliminar
  6. Sou mais uma que não consegue separar a obra do homem. É que a obra É o homem.

    qto ao homem em questão, sempre me irritou a montes. E nem sequer conheço a obra dele. ahahah

    e agora, ao saber dessa pinochada...

    ResponderEliminar
  7. Tolan, o cogumelo é mais assustador que belo.

    ResponderEliminar
  8. E não é obra nenhuma. É a apoteose daquilo que o Conhecimento é nas mãos erradas.

    ResponderEliminar
  9. Infelizmente, lá está, sou uma desgraçada que não consegue apreciar as coisas pelo que elas são simplesmente, por nunca esquecer o que elas São, evocam, significam.

    ResponderEliminar
  10. Não podia discordar mais, nem percebo bem o que é isso de pactos com Belzebu. Leni Riefenstahl e Eisenstein não são menos geniais só porque trabalharam para assassinos. Da mesma forma, o talento de escritores como Céline, Knut Hamsun ou Mishima não deve (ou não deveria) ser posto em causa por causa das suas ideias ou convicções. É o que digo, ainda chegará o tempo em que o Hemingway será banido por ter gostado de tourada.

    ResponderEliminar